Com fim iminente do PTR, mobilização do dia 25 promete ser histórica diante do TJMG. População de toda bacia é convocada.

O mês de setembro caminha para se tornar um dos mais decisivos desde o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. O Programa de Transferência de Renda (PTR), criado como medida emergencial após a tragédia de 2019, chega ao seu último mês, e o encerramento antecipado, sem alternativa apresentada até agora, revolta os atingidos. A manifestação do dia 25 de setembro, em frente ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), em Belo Horizonte, já estava programada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), mas com o anúncio do fim do PTR ganhou ainda mais força e deve atrair um público maior, reunindo centenas de pessoas de toda a bacia do Paraopeba e transformando a data em um marco de resistência.
O protesto não se limita apenas à cobrança pelo julgamento do recurso sobre o auxílio emergencial, que já se arrasta no tribunal. Ele simboliza a indignação coletiva diante da falta de respostas concretas para quem perdeu o sustento no rio, principalmente pescadores, agricultores e comerciantes que dependiam diretamente do Paraopeba antes do rompimento da barragem. Para essas famílias, o PTR significava não só uma compensação mínima, mas a diferença entre conseguir pagar as contas e cair na miséria. Com o fim anunciado, o desespero cresce a cada dia.
A mobilização ganhou força também pelo silêncio das instituições locais. Até agora, não houve nenhuma manifestação pública do poder executivo ou legislativo de Brumadinho sobre o término do programa. A ausência de posicionamento surpreende ainda mais porque, durante a campanha eleitoral que levou a atual gestão ao comando da prefeitura, a principal promessa era a criação de um novo auxílio municipal para substituir o PTR. A expectativa, construída em cima desse compromisso, nunca saiu do papel.
Especialistas em finanças públicas apontam que essa promessa dificilmente poderia ser cumprida. Para implantar um programa semelhante ao PTR com recursos exclusivamente municipais, Brumadinho teria que mais que dobrar sua arrecadação anual, algo inviável no cenário atual. O orçamento da cidade, embora impactado pela arrecadação de impostos ligados à mineração, não comportaria tamanha despesa sem comprometer serviços essenciais como saúde, educação e infraestrutura. Esse dado escancara o abismo entre o discurso eleitoral e a realidade administrativa.
Enquanto isso, o TJMG ainda não definiu uma posição final sobre a continuidade do auxílio emergencial. O julgamento do caso, previsto para este mês, foi adiado mais uma vez, prolongando a angústia de milhares de famílias. Essa demora é vista pelos atingidos como mais um capítulo do histórico de postergações que marcam os processos relacionados à reparação. Desde 2019, os prazos se estendem, recursos se acumulam e decisões se arrastam, enquanto a vida das pessoas segue paralisada.
O MAB, que há anos acompanha de perto o andamento judicial, avalia que a manifestação do dia 25 será um divisor de águas. Além de pressionar o tribunal, o movimento pretende expor a contradição entre a magnitude da tragédia e a lentidão das respostas do sistema de justiça e dos governos. Para os atingidos, não se trata apenas de dinheiro, mas de dignidade. O PTR, mesmo limitado, ofereceu um mínimo de segurança para que essas famílias não fossem completamente abandonadas à própria sorte.
O clima de revolta é reforçado pelo contraste entre a situação das comunidades e os lucros da mineradora. Desde o rompimento, a Vale retomou parte significativa de suas atividades e segue registrando lucros bilionários, enquanto milhares de atingidos ainda enfrentam incerteza financeira. Para muitos, o encerramento do PTR sem substituto significa um novo colapso, desta vez social.
A manifestação promete ecoar não só em Belo Horizonte, mas também nas cidades da bacia do Paraopeba. Caravanas estão sendo organizadas em diferentes municípios, com ônibus levando famílias inteiras para participar do ato. A ideia é mostrar que o problema não é isolado, mas atinge uma região inteira que continua sofrendo os efeitos da lama.
Diante da mobilização crescente, a cobrança se amplia para além do TJMG. A ausência de uma resposta da prefeitura e da Câmara de Brumadinho é vista como um sinal de negligência com a população que mais sofreu. Lideranças comunitárias lembram que, se havia limitações financeiras para a criação de um novo auxílio, ao menos seria esperado um posicionamento claro, reconhecendo a impossibilidade e apontando alternativas de políticas sociais. O silêncio, no entanto, tem sido a regra.
O encerramento do PTR expõe mais uma vez a fragilidade das políticas de reparação em Brumadinho. Após seis anos, a reparação plena segue distante e fragmentada, com programas descontinuados, ações judiciais arrastadas e promessas eleitorais que não se concretizam. A manifestação do dia 25 será, portanto, mais que um ato em defesa da renda mínima. Será um grito coletivo de uma população que se recusa a aceitar o esquecimento e exige respeito.
No último mês de vigência do programa, Brumadinho e toda a bacia do Paraopeba se preparam para um ato que pode se tornar histórico. O fim iminente do PTR não é apenas o fim de um auxílio. É a revelação de uma luta que ainda está longe de terminar.
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